domingo, 10 de janeiro de 2016

Maternidade: desconstruindo o politicamente correcto.

Sou uma pessoa que gosta das verdades.
Por mais duras e politicamente incorrectas que sejam. Por muito que a maioria das pessoas lhes passe ao lado, vire a cara e se recuse a falar abertamente. 

A maternidade é um dos temas que contém verdades sobre as quais ninguém quer falar.
Sim: ter um filho é a melhor coisa do mundo, é um amor sem explicação, é uma maravilha! Mas há muita coisa que ninguém te conta...! E nem tudo é bonito...



Começa no parto e na amamentação. A forma como parimos e alimentamos os bebés tem consequências e há recomendações mundiais que não são seguidas em muitas das maternidades portuguesas, nem tão pouco se informam as mulheres sobre tal coisa  (este é um tema que dá pano para mangas e poderemos voltar a ele noutra altura mas se te traz curiosidade lê um pouco do meu outro blog).

Aqueles bebés cor-de-rosa, fofinhos, vestidos de cueiros com golas de príncipe, imaculados, que estão sempre a dormir... Não existem! Não, os bebés não são sempre lindos, as mães nem sempre se apaixonam por eles nos primeiros segundos, a amamentação nem sempre é apoiada e pode tornar-se difícil se não encontrares a ajuda certa...

Não, os bebés não dormem sozinhos, soninhos angelicais de 3 horas, acordando apenas para mamar 5 minutos, arrotar, mudar a fralda e voltar a dormir no berço de folhinhos... os bebés choram, querem estar sempre ao colo e procuram a mama na maioria do tempo em que estão acordados. Fazem cocós gigantes que saltam da fralda e lhes chegam às costas e ao pescoço. Sim, haverá dias em que não consegues sequer tomar um duche e despir o pijama... e ir à casa de banho parecerá uma tarefa quase impossível... 

A relação com o marido, namorado, companheiro (o pai da criança, pronto) não fica igual. E há homens (mesmo aqueles já crescidos) que têm um choque inicial ao verem-se confrontados com todas as exigências da paternidade. Nem sempre as reacções vão ao encontro daquilo que a mulher criou como expectativa em relação ao seu companheiro, ao tornar-se pai. 

A família e os amigos também têm, muitas vezes, atitudes inesperadas... por vezes, ao invés de serem o porto seguro que esperaríamos, focam a sua atenção em criticar, em dizer "no meu tempo fazia-se assim" ou "o teu leite deve ser fraco", "o bebé deve estar cheio de frio", "deixa-o chorar", "não lhe pegues tanto senão habitua-se ao colo", etc., etc., exasperando a recém-mãe ao ponto de lhe apetecer dar um sonoro rugido de leoa e mandar toda a gente à senhora que os deu à luz. Ou não. Em alturas de maior fragilidade pode apetecer-lhe simplesmente chorar e desaparecer...

Alguns desses familiares e amigos impõem a sua presença da forma mais inoportuna. Ao invés de nos trazerem uma refeição quente (não temos tempo nem forças para cozinhar) aparecem sem avisar, depois de uma noite em branco e deixam-se ficar, esperando pela hora do lanche. Ao invés de pegarem numa vassoura, lavarem alguma loiça ou dobrarem umas meias, só querem brincar aos bebés, passam o "boneco" de colo em colo e repetem várias vezes que estão disponíveis para serem baby-sitters. Acham mesmo que o melhor que podem fazer por uma nova família é tomar conta de um bebé de 2 semanas enquanto a mãe recém-parida, exausta e dorida, limpa e cozinha...?

Quando as visitas se vão embora e o marido volta ao trabalho fica a solidão e a insegurança. Onde estão as outras mães e bebés...? Fechadas e sós, cada uma no seu apartamento. Como favos numa colmeia. Quem as vai ajudar, tirar dúvidas e receios? Toda a gente trabalha e tem a sua vida, ninguém se parece importar...

Outro dos temas de que se fala pouco é a maternidade e o trabalho. 
Apesar de parecer mentira, ainda nos dias de hoje há mulheres a serem despedidas porque anunciam que vão ser mães. Na melhor das hipóteses não são despedidas mas ficam "encostadas à prateleira" (pelo menos) até os filhos serem crescidos. Sim, porque mesmo que pela fachada se diga que o melhor do mundo são as crianças, poucos serão os que gostam de ser patrões de uma recém-mãe. 

Consultas, doenças, atrasos, licenças de amamentação, reivindicação de direitos...? Hum... nada produtivo para a empresa... por vezes nem mesmo os colegas gostam e com frequência olham de lado e mandam bocas quando sais porque a licença de amamentação te permite ir um pouco mais cedo buscar o bebé: "Boa vida! Também eu queria...!"  - diz, ressabiado, o Manel da contabilidade, enquanto cochicha para o colega João "Esperta é ela...! Vai para o cabeleireiro e para as compras! Ou pensas que vai mesmo buscar o bebé a esta hora...? E nós é que ficamos a fazer o trabalho dela..."

Além da tua alma mudar com tudo isto, o teu corpo também vai mudar. Barriga, celulite, estrias, hemorróidas, incontinência, mamas doridas a rebentar de leite... são coisas que podem acontecer...

A tua vida vai tornar-se num constante jogo de malabarismo: tentando equilibrar todos os papéis da tua vida e não descurando nenhum. Ser Mulher, cuidar-se, ter boa aparência, ser boa dona-de-casa, ser uma companheira carinhosa e dedicada, uma amante calorosa, continuar a ter amigas e vida social, ser um apoio para a família, ser boa profissional (não deixar que a vida pessoal afecte a laboral) e ser boa mãe. Estar presente, participar activamente na escola, cuidar, acarinhar. Há uns tempos li uma frase numa rede social que dizia: "A sociedade espera que sejas Mãe como se não trabalhasses e que trabalhes como se não fosses Mãe". Resumo ideal. A verdade é que se uma mãe deixar cair uma das peças do seu jogo, não faltarão dedos a apontar a "falha".

Se não se arranja é desleixada.
Se não cuida a casa é preguiçosa e porca.
Se não dá atenção ao marido é fria e está a empurrá-lo para arranjar outra.
Se não telefona às amigas é porque não quer saber delas.
Se não está tão disponível para a família é desnaturada.
Se não está a 100% no trabalho é incompetente.
E como mãe, então... os julgamentos são ainda mais ferozes...

Decidi perguntar às fantásticas Mães do meu grupo, quais as coisas que mais as surpreenderam na maternidade, aquelas de que não estavam à espera e das quais ninguém as avisou. Eis alguns dos sentidos testemunhos: 

Sem dúvida a privação de sono! Tenho dias de dar em doida... - Cláudia

As opiniões dos outros que acham que são donos da verdade absoluta - Michele


Que existem efeitos secundários da anestesia e dos partos longos sobre o bebé que podem interferir na amamentação - Vânia


A pausa no casamento. Não há vontade nem desejo que apareça com aquele cansaço inicial. Só apetece mimo, o resto fica em stand by - Filipa


Viver em função das necessidades do bebé, a falta de liberdade e muita resistência a tanta dependência do bebé; haver tantas teorias contrárias sobre como ser mãe quer nos cuidados físicos do bebé, quer na educação - Ana


A falta de apoio do hospital relativamente à amamentação e a falta de condições para que as mães possam estar com os bebés se eles tiverem que ficar internados. Isso surpreendeu-me pela negativa. - Patrícia


Ainda hoje não consigo ultrapassar o sentimento de culpa por não ter amamentado o meu filho. Ainda hoje não esqueço algumas vozes que me disseram, e até me gritaram, que eu tinha o meu filho à fome. Ainda hoje não esqueço. Ainda hoje dói - Ângela

O que me custou mais depois do parto foi ver que afinal a barriga e toda a zona abdominal não vai logo ao lugar! Nas revistas e tv as mulheres saem logo da maternidade lindas e maravilhosas e a realidade é bem diferente... - Susana

Sair da maternidade com o sentimento de culpa por não sentir aquele amor de quem todos sempre falaram - Vi


Ninguém me falou da depressão pós parto, nem sabia que existia. Fui apanhada de surpresa foi muito difícil para mim o pós parto. Senti-me muito sozinha e tinha sempre a sensação de não estar a fazer bem o meu trabalho de mãe - An


Para mim foi o D ter nascido prematuro. Nunca pensei que fosse acontecer. Não estava preparada, não o vi nascer, só vi a cara dele passado mais de uma semana. Não me senti mãe. Não o amei logo - Mónica

O sentimento de incapacidade de cuidar daquele ser tão frágil.
Ao mesmo tempo, dá vontade de gritar com todos os que querem pegar no bebé quando ainda só tem uns dias de vida, tão fragilizado, e pensam que é um boneco, pensam que têm d
ireito ao corpo dele.
O facto das pessoas não aceitarem que NÓS somos os pais, e não eles; os bitaites que não pedimos, conselhos, informações erradas na internet, ideias e expectativas ,raramente verdadeiras, sobre o sono e comportamentos do bebé...
A impotência perante o mundo estar contra nós nas escolhas que fazemos para o bem estar dos nossos filhos, até mesmo o marido por vezes...
- Tânia


Ninguém me ter avisado que o pai também precisa do espaço dele, e que para ele também é um período de aprendizagem. Umas horas depois de ter chegado da maternidade disse ao meu marido que queria o divórcio. Tudo nele me irritava... -Filipa


Que no primeiro mês não há dias... Nem noites.. "que dia é hoje mesmo? O mesmo que há bocado? Já passaram 2 dias? Hein? Banho?...tenho sede!" - Liliana


O cansaço extremo e a pressão da sociedade para fazermos tudo: sermos mães perfeitas, donas de casa perfeitas e ainda trabalharmos. E as mentiras dos outros. Sim, os outros pais mentem. Quantas vezes ouvi "dorme a noite toda" porque a minha é que era estranha e depois apanhei a verdade. Ou que o neto desfraldou aos 18 meses e depois a mãe diz que começou a ensinar a usar o pote aos 2 anos... - Micaela


A falta de tempo para gozarmos o nosso bebé. Se por um lado, já sentia alguma falta de sair para trabalhar, agora que voltei ao trabalho estou sempre inquieta para voltar para casa. O Bebé 7 e 8h /dia na escola. Milhares de coisas para fazer (compras, limpezas, roupa, comida, etc) que mesmo com um marido que ajuda 100%, aparecem sempre mais.... Não há tempo... - Joana


É extremamente difícil conciliar as exigências de uma família com as exigências profissionais. - Sofia


Os meus Parabéns e um grande Obrigada às maravilhosas Mães que se prestaram a partilhar os seus valentes testemunhos. Valentes, sim, porque nem todas as Mulheres são capazes de falar abertamente e expor os seus sentimentos e vulnerabilidades.. Por vezes nem mesmo entre amigas íntimas! Este texto é para elas. E para todas as Mulheres que por aqui apareçam (mães ou não).

E como muito mais se poderia dizer, vamos voltar a alguns destes temas mais para a frente...



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